Jeff Bridges: carisma a qualquer custo

Jeff Bridges é um daqueles atores que nunca sai de moda. Ao longo de quase seis décadas de atuação, o ator nascido em Los Angeles acumula personagens memoráveis em sua vasta filmografia. Parte desta longevidade no cinema se deve ao carisma do ator em construir figuras criveis, do tipo gente como a gente. Seja na pele de galãs, cantor country, drogados desocupados, homem das estrelas, policiais do velho oeste… Sempre é um prazer vê-lo em cena. É como um típico encontro esporádico que temos com aquele senhor do fim da rua, que, vez ou outra, nos aborda para trocar meia dúzia de palavras engraçadas e tornar o nosso dia mais agradável.

Por isso, não causa espanto que a atuação de Bridges no longo independente A Qualquer Custo, de David Mackenzie, tenha sido uma das mais festejadas dessa temporada de premiações. E que, desde já, entra para o rol dos personagens marcantes interpretados pelo ator acostumado a dar as caras em blockbusters, como Homem de Ferro e Tron: O Legado, e em longas mais pomposos e profundos como A Conspiração, na pele do presidente dos Estados Unidos, O Pescador de Ilusões, interpretando um locutor de rádio deprimido e atormentado pela culpa, e Coração Louco, no qual dá vida ao cantor country Bad Blake e que lhe rendeu seu único e merecido Oscar de Ator.

Na recente produção de Mackenzie, Bridges rouba todas as cenas em que aparece na pele do xerife Marcus Hamilton, que precisa capturar dois ladrões de agências bancárias no interior do Texas. Entre uma cena e outra, ele alterna o olhar cansado de um homem de meia idade que precisa lutar contra a iminente aposentadoria com comentários racistas e xenofóbicos que dispara contra o seu parceiro de investigação de traços indígenas e descendência mexicana. Nas mãos de um ator qualquer este personagem cairia facilmente na caricatura, mas Bridges tem a experiência e a desenvoltura certa para dar a profundidade necessária à persona inquieta e destemida de Hamilton durante as investigações desses roubos.

A dupla por trás desses assaltos é formada pelos irmãos Tanner (Ben Foster) e Toby (Chris Pine) que pretendem juntar certa quantia de dinheiro para salvar a propriedade da família e honrar o nome da mãe que faleceu há poucos dias. O roteiro do longa é hábil e sutil para traçar o perfil psicológico dos irmãos sem recorrer ao pieguismo e ao julgamento barato. Enquanto o personagem de Pine se apresenta cerebral e minucioso nas ações, o ex-presidário Tanner – interpretado com muita competência por Foster – é uma bomba relógio prestes a explodir, mas que demonstra afeto comovente pelo irmão e não mede esforços para manter os interesses da família e conseguir levar o plano da dupla adiante.

A fotografia árida contribui para empregar a sensação de desesperança e de amargura dos personagens, principalmente quando a câmera se concentra nas amplas propriedades abandonadas de terras inférteis do interior do Texas. Assim, além de dar conta dessa perseguição de gato e rato do trio central da história, Mackenzie reserva espaço para abordar, como pano de fundo, a crise econômica que assolou os Estados Unidos na última década, causou a quebra do setor imobiliário e obrigou milhares de famílias a se afundarem para honrar as suas hipotecas na tentativa de resgatar o mínimo de dignidade possível. Com esta história tensa e eficiente, A Qualquer Custo se credenciou, com mérito, como um dos grandes filmes dessa temporada e um dos grandes faroestes modernos. Na cerimônia, do Oscar 2017, por exemplo, o longa foi lembrado em quatro importantes categorias: Filme, Roteiro Original, Edição e Ator Coadjuvante, esta última, claro, para Bridges – que, por sua vez, acumula agora sete indicações ao prêmio.

Ben Foster e Chris Pine

E olha que era para ter pelo menos mais uma nesta conta, já que, em 1999, a Academia esnobou justamente uma das atuações mais célebres do ator na comédia corrosiva O Grande Lebowski, dos Irmãos Coen. Praticamente esquecida na época de seu lançamento, este longa resistiu ao tempo e ganhou legião de fãs graças à brilhante encarnação de Bridges na pele de Jeff Lebowski, ou simplesmente The Dude (O Cara) -, um vagabundo de carteirinha que é confundindo com o poderoso milionário de mesmo nome. A influência deste personagem é tamanha que inspirou até a criação de uma religião “A Igreja do Cara dos Últimos Dias”, popularmente conhecida por “Dudeismo”, que já conta 400 mil sacerdotes ordenados em todo o mundo. Dúvida? Então olha aqui.

A parceria do ator com os Coen se repetiria mais de uma década depois com o faroeste Bravura Indômita, no qual interpreta o federal rabugento e bêbado Rooster Cogburn, contratado por uma adolescente (Hailee Steinfeld) para capturar o assassino do pai dela. As variações de humor de Cogburn, graças ao nível alcoólico, tiradas sarcásticas e a combinação homem da lei carismático/cenário western, transforma esta personificação de Bridges em uma espécie de precursora do policial Hamilton de A Qualquer Custo. Mas a principal diferença entre os dois é que, neste último longa, o personagem de Bridges não deixa a fadiga atrapalhar a investigação e a busca pelos criminosos. O que move o personagem aqui é o desejo compulsivo de justiça e a necessidade de fazê-la com com as próprias mãos.

Se essa nova persona justiceira de Bridges será novamente o favorito da Academia, só saberemos mesmo no dia 26 de fevereiro. Mas, com certeza, o xerife Hamilton, dono de uma personalidade implacável e de língua afiada, não deve ligar muito para isso. E, neste momento, ele provavelmente esteja em casa com o olhar inquieto matutando uma forma de voltar à ativa enquanto escuta as sábias palavras do seu camarada Dude.

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