É hora de fazermos um balanço de como foi a 70ª edição do Globo de Ouro, tradicional prêmio do cinema americano dado pela Associação de Correspondentes Estrangeiros de Hollywood (HFPA). Em sua edição de 2013, o Globo teve a sorte de convidar como apresentadoras as engraçadíssimas Tina Fey e Amy Poehler. Parceiras de Saturday Night Live, as duas tiveram a responsabilidade de substituir o polêmico Ricky Gervais, que apresentou a premiação nos últimos anos, mas acabou sendo chutado do posto de apresentador.
Primeiro porque pegou pesado demais nas piadas, que geraram aquele ~climão maneiro~ entre as celebridades. Depois, no ano seguinte, porque o humorista foi podado pela produção e teve de pegar muito mais leve, perdendo totalmente a graça. Mas esse não foi um problema para a dupla, que soube muito bem ser provocadora sem ser ofensiva.
Exemplos? Dizer para Kathryn Bigelow que ela deve ter aprendido muita coisa sobre tortura tendo sido casada com James Cameron, e para a cantora Taylor Swift manter distância do filho do ator Michael J. Fox, Sam Fox, que era o mister Golden Globe deste ano, ao lado da miss Francesca Eastwood, filha de Clint, que foram os responsáveis por conduzir os troféus ao palco da premiação.
Depois do sucesso de Tina e Amy como apresentadoras do Globo 2013, dificilmente a HFPA vai querer escolher outros apresentadores para o próximo ano, a menos que tenhamos a sorte de ganhar a inclusão de outro nome engraçadíssimo e que ontem deu um show ao lado de Will Ferrell, a atriz Kristen Wiig (Saturday Night Live e Missão Madrinha de Casamento). É, Gervais, ficou pouco pra você, meu caro!
O prêmio
É importante destacarmos aqui que o Globo de Ouro é um prêmio bastante diferente do Oscar (principalmente) e dos prêmios dos sindicatos. Os indicados e vencedores são escolhidos por um número muito inferior ao do prêmio da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood. Aqui, são apenas 90 votantes. Todos jornalistas estrangeiros que são correspondentes direto de Los Angeles para seus países, inclusive o Brasil, que tem duas representantes, Ana Maria Bahiana e Paoula Abou-Jaoude.
Ou seja, é gente que entende como funciona a roda de Hollywood, está no olho do furacão, mas participa de tudo como mero observador e repórter daquilo que vê. Não é membro atuante dentro dos estúdios, não faz parte de equipes de sets de filmagens. Não é gente que bota a mão na massa e tem grandes interesses financeiros (até onde se sabe) na máquina de fantasia hollywoodiana.
Resumindo: é um votante completamente diferente do Oscar e, portanto, não espere que os resultados do Oscar sejam iguais aos do Globo, porque não serão. Principalmente porque o Globo já premiou, por exemplo, Ben Affleck como Melhor Diretor e a Academia sequer o incluiu entre os cinco finalistas. O que quero dizer com tudo isso? Que o Globo exerce pouca, ou quase nenhuma, influência no Oscar, que é muito mais influenciado pelos prêmios dos sindicatos de cada categoria, onde os membros votantes são basicamente os mesmos do Oscar. Mas falemos do prêmio da Academia quando for a hora dele.
Os vencedores
Dito isso, vamos aos vencedores da noite (que podem ser consultados aqui), que merecem algumas boas observações a respeito de suas vitórias e de quem venceram. De seus discursos e de como chegam, aos olhos do mundo, como favoritos ou não à corrida pelo Oscar, que afinal de contas é o prêmio mais desejado por todos esses astros.
Ben Affleck parece ter mais créditos com os membros da HFPA (mais jovens e mais bem divididos por gênero) do que com os da Academia, que em sua esmagadora maioria são homens e idosos. E esses créditos foram suficientes para vencer nomes fortes como Kathryn Bigelow, Ang Lee, Quentin Tarantino e Steven Spielberg, que sofreu outra grande derrota na noite ao ver seu filme, Lincoln, também perder o prêmio principal para Argo, de… Ben Affleck.
O mais curioso de tudo é que o lobby em cima de Lincoln estava tão forte (e continua), que para apresentá-lo como um dos indicados da noite, Spielberg conseguiu ninguém menos que o ex-presidente Bill Clinton (como pode ser visto aqui). Isso demonstra duas coisas: Spielberg é, há muitos anos, o nome mais influente de Hollywood; ele não veio para perder em 2013. Mas falemos do cineasta de boné mais famoso do mundo daqui a pouco.
Entre os prêmios de atuação, vale destacar as vitórias de Hugh Jackman e Anne Hathaway pelo musical Os Miseráveis (que também faturou o prêmio de Melhor Comédia ou Musical) e de como o discurso de Anne foi tocante. A atriz não apenas demonstrou muito carisma, como sempre faz, mas não se esqueceu de agradecer a Sally Field por toda a influência que exerceu em sua carreira e em todas as atrizes de sua geração.
Outro discurso que gerou burburinho foi o de Jennifer Lawrence, que subiu eufórica ao palco e mandou um “eu venci a Meryl Streep”, que deixou algumas pessoas receosas sobre ter sido ou não uma brincadeira. Aliás, sua vitória não foi pequena. Não apenas venceu Meryl Streep como também Judi Dench e Maggie Smith, duas lendas do cinema e do teatro inglês. Jennifer também não se esqueceu de agradecer a Harvey Weinstein, a quem era grata por “ter matado quem tivesse de matar para colocá-la ali”. E bom… falaremos um pouco mais do Weinstein quando falarmos de Spielberg.
Quentin Tarantino venceu pelo roteiro de Django Livre e subiu ao palco meio alcoolizado já, mas não deu vexame. O filme também recebeu outro prêmio importante, o de Ator Coadjuvante, com Christoph Waltz, que não se esqueceu de ser grato a Tarantino pelo papel, mais uma vez escrito especificamente para ele, assim como o de Bastardos Inglórios, que lhe rendeu seu primeiro Globo.
Valente foi escolhido como Melhor Filme de Animação, mas parece ter deixado todo mundo com um pezinho atrás, já que o filme que traz a primeira heroína da Pixar, apesar de bom, não é nenhuma obra-prima como o estúdio está acostumado a fazer. A britânica Adele confirmou seu favoritismo e faturou o prêmio de Melhor Canção por Skyfall, tema do novo filme de 007, Operação Skyfall. Foi a mais animada premiada a subir ao palco. E isso ainda deve se repetir no Oscar, para a felicidade geral de todos.
Quem também comprovou seu favoritismo foi o cineasta austríaco Michael Haneke, que recebeu o prêmio das mãos de Sylvester Stallone e do conterrâneo Arnold Schwarzenegger, pelo longa Amor, como Melhor Filme Estrangeiro. O filme de Haneke também chega com muito peso ao Oscar, concorrendo a quatro categorias: Filme, Filmes Estrangeiro, Diretor e Atriz, com Emmannuelle Riva.
E em se tratando de favoritismo, o que falar de Daniel Day-Lewis em seu papel como Lincoln? Há aproximadamente um ano, quando foi divulgada a primeira foto do ator caracterizado como o ex-presidente americano, todo mundo já sabia que ele viria forte para a temporada de ouro, e não deu outra: Melhor Ator de Drama. Mas tenho lá minhas suspeitas sobre sua participação no Globo. Em vários momentos foi citado que Meryl Streep não estava presente na cerimônia, pois estaria com uma forte gripe. Suspeito, na verdade, que o gripado era Day-Lewis, que ficou em casa e pediu para que Meryl o substituísse caracterizada como ele.
Brincadeiras à parte, é importante reconhecer que Day-Lewis é um dos maiores (para muita gente o maior) atores vivos do cinema e mesmo que ainda não tenhamos visto Lincoln, todo prêmio para ele é pouco.
Spielberg x Weinstein
Como dito anteriormente, Steven Spielberg é o nome mais influente de Hollywood, apesar de não ser o único. Mas é reconhecido por fazer seu jogo de influências de forma limpa, por cima dos panos. Quem joga feio, sujo e por debaixo dos panos são os irmãos Bob e Harvey Weinstein, ex-donos da Miramax, atuais donos da Weinstein Company, produtora e distribuidora de diversos filmes que, independentemente de sua qualidade, sempre chegam forte às premiações.
Outra hora dessas escrevo mais sobre a influência negativa e o jogo sujo dos Weinstein em Hollywood, mas é necessário agora que se saiba apenas que os dois são, por debaixo dos panos, os homens mais influentes de Hollywood. No ano passado, Meryl Streep ao vencer o Globo de Ouro, chegou a chamar Harvey de deus em seu agradecimento. Neste ano, Jennifer Lawrence foi mais longe e o agradeceu por ter matado quem tivesse de matar para que ela chegasse até ali. Espero que tenha sido apenas um pequeno exagero nas palavras de Jennifer, mas vindo dos Weinstein, nunca se sabe. Bob e Harvey são produtores de O Lado Bom da Vida, filme pelo qual a atriz foi premiada.
Pois bem, e por que raios o título Spielberg x Weinstein? Porque embora o Globo de Ouro não tenha demonstrado com tanta força a polaridade entre esses dois nomes, certamente veremos isso na próxima edição do Oscar a acontecer no final de fevereiro. As primeiras peças desse xadrez, aos olhos do público, foram movidas na noite deste domingo.
Spielberg, como já foi dito, parece que não veio para brincadeiras neste ano e foi capaz de colocar Bill Clinton no palco do Globo para anunciar seu filme. Lincoln é o grande favorito a vencer quase tudo no Oscar, e não apenas por suas 12 indicações, mas também porque é um filme formatado no padrão Oscar. Ele tem a cara da Academia. Filme de época, que retrata um período e uma personalidade histórica, que é ninguém menos que o presidente mais popular da história do país. E tem como protagonista o ator considerado pela revista Time como o maior do mundo. Ou seja, Lincoln e Spielberg vão para as cabeças.
Mas os Weinstein não deixaram por menos e emplacaram indicações importantíssimas para O Lado Bom da Vida, que também vem crescendo dia após dia no buzz dos Oscars e está indicado em absolutamente todas as principais categorias do prêmio, Filme, Ator e Atriz, Ator e Atriz Coadjuvantes, Direção, Roteiro Adaptado e Montagem. Se existe alguém que pode parar Spielberg, este alguém atende pelo sobrenome de Weinstein. A guerra está declarada!
Os prêmios de TV
Não é costume do Sétima Cena comentar os destaques da TV, mas já que estamos na festa, vamos entornar o balde. Uma das tristezas de ser fã de produções audiovisuais é não conseguir assistir a tudo o que é recomendado como bom. Gostaria de poder assistir a (quase) tudo o que concorreu ao Globo, mas é impossível.
Pois bem, existem dois grandes fenômenos recentes na TV americana. A comédia Girls, escrita, atuada e dirigida pela jovem Lena Dunham, e o drama Homeland. Como não poderia deixar de ser, ambas as séries saíram vitoriosas em suas categorias. Homeland com Ator, Atriz e Série de Drama. Girls, com Série de Comédia e Atriz, para a própria Lena.
Vi apenas o piloto de Girls e parece ser, de fato, muito divertida. Devo continuar assistindo e ver se merece realmente todo o burburinho. Mas há de se ressaltar a força de Lena Dunham como a nova queridinha dos americanos. A jovem venceu ninguém menos que três comediantes consagradas: as anfitriãs da festa, Tina Fey e Amy Poehler, e a lendária Elaine, de Seinfeld, Julia Louis-Dreyfus, que interpreta a vice-presidente americana em Veep.
Sobre Homeland, tenho de dizer que a série me decepcionou um pouquinho na segunda temporada. Continua boa, mas não teve a mesma força de sua temporada de estreia. Entre as cinco indicadas, além de Homeland, assisti apenas a The Newsroom, que em sua temporada de estreia me agradou muito mais que o drama estrelado por Claire Danes.
Acho que a série poderia ter sido mais bem reconhecida, pois tem um elenco surpreendente, encabeçado por Jeff Daniels, e um roteiro excelente de Aaron Sorkin. Fico na torcida para que, em 2014, a série tenha uma segunda chance.
Quem reinou entre as minisséries ou filmes para a TV foi a produção da HBO Virada no Jogo, estrelada por Julianne Moore. Levou Melhor Filme de TV, Melhor Atriz e Melhor Ator Coadjuvante, para Ed Harris. O filme é realmente muito bom e mostra como foi a corrida à presidência dos Estados Unidos nas eleições que transformaram em presidente Barack Obama, mas tudo isso acontece sob a ótica da republicana Sarah Palin, candidata à vice-presidência na chapa de John McCain, muito bem vivido por Ed Harris. Julianne Moore realmente se transformou na ex-governadora do Alasca e mereceu o prêmio.
Uma pena Woody Harrelson não ter vencido como Melhor Ator, pois também está ótimo. Perdeu o prêmio para Kevin Costner, que parece ter renascido das cinzas e conquistou o prêmio pela minissérie Hatfields & McCoys. Alguma dúvida de que estou muito interessado em assisti-la?